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  • janeiro 18, 2017

‘Pai é quem ama’: TJ autoriza reconhecimento de paternidade sem DNA

A família tem sido ponto da discussão política nos últimos anos. Seja o lado conservador, ou de quem é a favor da ampliação do conceito, fato é que a configuração do núcleo familiar mudou. Agora, quem reconhece a mudança é o Judiciário de Mato Grosso do Sul. O provimento 149/2017, da corregedoria do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) – publicado no Diário do TJ desta quarta-feira (18) -, reconhece e regulamenta a chamada paternidade socioafetiva, quando o vínculo não é biológico, mas a pessoa estabelece laços afetivos de paternidade com a criança.

Antes do provimento, a criança que não possuísse registro paterno, mas cujo pai afetivo quisesse reconhecê-la, era necessário ingressar com pedido na Justiça. Agora, basta apresentar  documento  de  identificação  com  foto,  certidão  de  nascimento  do  filho,  em  original ou cópia, no cartório de registro civil.

O provimento segue uma jurisprudência já consolidada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nos últimos anos. A mudança, além de reconhecer a igualdade da ‘verdade afetiva’ perante a ‘verdade sanguínea’ deixa o reconhecimento mais rápido e mais ‘econômico’, para a família e para o Judiciário. É o que explica a juíza auxiliar da corregedoria do TJ, Elizabete Anache.

“É um processo que tem seus custos, no seu tempo. Agora, o provimento permite que essa pessoa que quer fazer o reconhecimento vá direto ao cartório de registro civil, e declare a verdade afetiva, ou seja, está reconhecendo como filho aquela pessoa em razão dos laços afetivos. O que acontecia antigamente, acontecia a chamada adoção à brasileira, alguém que não queria ter o trabalho de entrar com um processo, ia lá e reconhecia como filho, como se fosse filho biológico e ficava naquilo: ah, reconheceu a paternidade, mas é uma paternidade biológica que não corresponde a realidade e aí ficava sempre aquela discussão. Agora não, agora é possível que alguém possa verdadeiramente reconhecer a paternidade socioafetiva sem que isso precise ser mascarado”, explica Elizabete.

E o pai biológico?

A paternidade socioafetiva, no entanto, não retira as obrigações do pai biológico. Esse é o entendimento do STF, que discutiu a questão dia 21 de setembro de 2016. Por maioria de votos, os ministros negaram provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 898060, com repercussão geral reconhecida, em que um pai biológico recorria contra acórdão que estabeleceu sua paternidade, com efeitos patrimoniais, independentemente do vínculo com o pai socioafetivo.

 

 

A juíza Elizabete Anache (divulgação)A juíza Elizabete Anache (divulgação)

“O STF já entendeu que a paternidade socioafetiva e a biológica podem até ser concomitantes. O provimento é até uma questão de repercusão geral, a gente cita isso nos considerandos do provimento. A única coisa que foi regulamentada, até pra fins de uniformização, de tratamento e de facilidade para a população, é que quando o filho é criado por alguém que não é o pai biológico, mas com quem mantém vínculos afetivos fortes, o pai, ao pretender fazer esse reconhecimento, ao pretender dar seu nome a esse filho, precisaria, via de regra, de uma declaração judicial, precisaria de um processo”, explica a juíza.

 

Ao registrar a paternidade socioafetiva, o pai tem as mesmas obrigações de um pai biológico. “Não existe distinção entre os tipos de paternidade, o pai socioafetivo é pai tal qual o pai biológico, tem que cumprir com todas as obrigações”, complementa a magistrada.

Essa obrigatoriedade de cumprir com os direitos já foi alvo de decisão em Mato Grosso do Sul. Isso porque um pai adotivo, ao separar-se da esposa, decidiu retirar o registro de paternidade da filha. A 5ª Câmara Cível do TJ-MS, no entanto,  deu provimento ao recurso de filha, e o pai teve que cumprir com as obrigatoriedades da paternidade socioafetiva.

Em Mato Grosso do Sul, os cartórios ainda não sabem da mudança, ao menos é que demonstra um deles, cujo tabelião conversou com o jornal Midiamax. A mudança, no entanto, é simples e nesta quarta-feira (18), qualquer família já pode providenciar o registro.

Conforme declara a juíza, a afetividade não pode ser “ignorada pelo Direito”.

“E a Constituição e a evolução cultural já demonstram que é tão importante quanto o vínculo biológico ou, às vezes, até se sobrepõe a ele. As famílias estão se multiplicando, não existe mais aquele modelo tradicional do casamento durar para sempre, então é muito comum que as relações conjugais se alternem, então, às vezes, as relações filiais também sofre mutações, e tem uma afetividade que não pode ser ignorada pelo Direito”, conclui a magistrada.

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