- outubro 27, 2023
Música fronteiriça é tesouro singular de Mato Grosso do Sul
Longa “A Alma da Nossa Música: Marcelo Loureiro” estreou na 4ª feira (25.out) no UCI
O filme “A Alma da Nossa Música: Marcelo Loureiro” estreou na noite da quarta-feira (25 de outubro de 2023) no UCI, no Shopping Bosque dos Ipês, em Campo Grande (MS). A matéria original saiu no TeatrineTV.
Numa sessão lotada, a produção dirigida pela cineasta Ana Carla Loureiro demonstrou ao público que a música sul-mato-grossense é um tesouro brasileiro, justamente por sua miscigenação singular. “Eu quis mostrar a profundidade e a beleza dessa raiz fronteiriça. Ninguém aqui no Mato Grosso do Sul consegue ouvir uma Polca sem soltar o sapucay. Essa mistura é nossa e as fronteiras são políticas só, somos todos um! Em meu sangue tem sangue paraguaio, a nossa avó… A gente faz essa brincadeira do sotaque com muito carinho, como todo mundo que é filho de estrangeiro, a gente faz com muito carinho e muito respeito. Eu tenho honra das minhas raízes paraguaias. E falaremos sobre isso onde exibirmos esse filme, para exaltar a beleza pluralidade do ser humano. Esse filme foi concebido para ser exibido em escolas, tornar-se público no YouTube, eu pensei nisso primeiro para levar para essa gurizada a beleza dessa música, um tesouro singular”, introduziu Ana, em conversa com TeatrineTV ao final da sessão.
Mesclando a história musical e pessoal do multi-instrumentista Marcelo Loureiro — seu primo — Ana conseguiu produzir uma obra de extrema beleza estética, com clareza narrativa, excepcional apuro técnico e com alto potencial educativo. “Esse filme traz um resumo do meu trabalho, dos meus quase 25 anos de atuação no audiovisual. Eu venho do institucional, trabalhei muito com governos fazendo filmes institucionais e tem um outro lado, que é a minha veia artística também, de música”, anotou.
A diretora explicou que a influência direta do avô, Poty Loureiro, que tocava violino, acordeão, violão, a levou a estudar origens de gêneros musicais e o filme nasceu da união dos talentos dos primos Loureiros. “Eu tenho pesquisa com cantos sagrados, acabei de publicar um livro na Argentina que se chama ‘Um Caminho a Los Cantos Sagrados’ que é meu trabalho com pesquisa de cantos de povos originários, tenho uma relação forte com música, venho de uma família musical. Só que assim, o Marcelo pegou uma banda e eu acho que eu peguei um cadinho ali, que meu avô era um grande contador de histórias. Então, as lembranças que eu tenho muito querida dele, são as histórias que ele contava. E o Marcelo pegou a outra que é a música, então deu uma mistura boa”, avaliou a diretora.
PROTAGONISTA, NARRADOR E ENTREVISTADOR
No enredo, Marcelo embarca em um Opala vermelho saindo de Campo Grande, passando por Sidrolândia, Nioaque, Jardim, Bela Vista, até chegar a Guia Lopes da Laguna, cidade em que passou parte da infância.
No trajeto até suas raízes, o artista vai contando que nasceu no Rio de Janeiro e migrou com os pais para Guia Lopes da Laguna aos 11 anos, para cuidarem dos negócios da família, após o avô paterno falecer. “Meu pai é natural de Guia Lopes da Laguna e minha mãe de Caracol. Eles se casaram em Campo Grande e eu nasci no Rio de Janeiro”, explicou o músico num voice-over.
Foi em Guia Lopes da Laguna que Marcelo se conectou com a música por meio do avô Poty, que era um multi-instrumentista, que, no entanto, havia sido acometido por um derrame e perdeu parte do movimento dos braços, ficando impedido de tocar. Ainda assim, Poty influenciou o neto a buscar aulas de violão na adolescência. Pouco depois, Marcelo já estava tocando e conseguiu registrar em vídeo um momento ímpar em que toca a guarânia “Mi Dicha Lejana” para o avô cantar.
“Marcou demais relembrar todo o passado, com certeza. Eu não comentei com a Ana, mas daqui 5 dias vão fazer 30 anos exatamente que aquele vídeo ali [que aparece no filme] foi gravado, eu com meu avô. E dia 13 de novembro completa 30 anos que meu avô faleceu, então assim, resgatar todas essas memórias foi emocionante, mexeu profundamente comigo. Principalmente quando estávamos fazendo as cenas em Guia Lopes da Laguna, na casa da minha avó. Nós perdemos a nossa avó há pouco tempo, durante a pandemia, então uma lembrança traz a outra, que traz a outra, a minha infância, a memorada em Guia Lopes. Com certeza isso foi o que mais me marcou nesse projeto”, comentou Loureiro.
Na viagem de Opala, além de rememorar trechos marcantes, Marcelo também realiza entrevistas com pesquisadores da música fronteiriça e ao mesmo tempo faz uma “palinha” com cada um deles. Os entrevistados por Marcelo foram Evandro Higa, Altamiro Martins, Rodrigo Teixeira, Romy Martínez e David Portillo. Além de cidades brasileiras, Marcelo esteve em Bella Vista Norte e Assunção. Apenas a entrevista com Romy, que está na Europa, foi feita por chamada de vídeo.
Questionado sobre o desafio de atuar como entrevistador no longa, Marcelo foi sucinto: “Eu já tinha feito algumas coisas, mas não dessa forma entrevistando num filme de cunho cultural. Então assim, não é fácil, você tem que estar concentrado no texto, na música, atento à entrevista com os expoentes, então foi uma ótima experiência”.
TEIXEIRA E SIMÕES
Dos entrevistados citados acima, a reportagem conseguiu falar com Rodrigo que vive em Campo Grande e esteve na sessão de estreia. Para Teixeira, o bacana do filme é que a Ana não ficou presa apenas a questão musical. “Ela contextualizou essa música, que o Marcelo Loureiro é um dos artistas mais representativos que a gente tem aqui, que é a música fronteiriça regional sul-mato-grossense. Essa música fronteiriça brasileira que a gente tem aqui no Mato Grosso do Sul e tem uma peculiaridade muito grande, por essa aproximação com o Paraguai. E aí a Ana traz um produto audiovisual que vai além só da música e traz pesquisadores importantes como o Evandro Higa, a Romy Martínez e aí transforma um produto que seria mais ligado a música em algo mais educativo, propondo também informações históricas, geográficas, sociais, culturais, enfim uma maravilha!”, analisou.
Teixeira ainda revelou o que mais o agradou no filme: “O que mais gostei foi ver o Marcelo Loureiro compondo, então eu gostei muito dele tocar uma música composta por ele, que daí completa esse grande artista que já é um multi-instrumentista muito bom, então Marcelo Loureiro, continue compondo por favor”, Teixeira.
Outra grande personalidade da música presente na estreia, Paulo Simões – citado no filme como referência da música sul-mato-grossense – classificou como rara a experiência oferecida pelo filme de Ana. “Oportunidade rara, uma surpresa agradabilíssima em todos os setores. Técnica, som impecável. Eu só queria saber afinal se o Marcelo é o mocinho desse filme? O filme conseguiu aliar o didatismo a uma leveza muito grande, proporcionada ou ampliada pela música excepcionalmente bem tocada e escolhida, faz a gente querer assistir novamente no YouTube. Eu vou assistir mais de uma vez pode ter certeza, com muito prazer e honra”, disse.
ESTREIA AOS 90 ANOS
Além de oportunizar um mergulho na história de Marcelo e da música fronteiriça, o longa de Ana abriu espaço para dramatizações, ocasião em que a nonagenária Carmen Insfran Loureiro fez sua estreia nas telas. “Muita emoção, muita coisa, nossa vida, nossas festas. Eu estou muito feliz, só tenho a agradecer, nessa idade ver toda a minha família ali. Gostei de tudo, me emocionei em cada parte. Eu estou com 91 anos, vendo ali a história e lembrando”.
Paraguaia radicada brasileira, Carmen nunca havia atuado no cinema, entretanto, disse não ter pensado duas vezes quando recebeu o convite para dramatizar uma cena em que Maria Arrua Loureiro aparece com sotaque paraguaio carregado falando ao telefone. “Eu nunca tinha feito filme, mas não neguei. Na hora que ela me chamou e fiz a cena, me deu uma emoção muito forte ali de reviver nossas alegrias, músicas e festas. De fazer aquela cena em homenagem a minha falecida cunhada. Foi muito forte para mim, por isso chorei ali, estou emocionada demais”, completou Carmen, chamada pela família pelo apelido Tia Chola.
Antes do início da sessão, Tia Chola, foi homenageada por sua performance no longa, recebendo um buquê de flores entregue por Marcelo Loureiro aplaudidade no meio da sala de cinema no UCI.
Conforme apurado, o documentário contem reconstituição de cenas com dramatização do seguinte elenco… VEJA A MATÉRIA COMPLETA NO TEATRINETV.