- março 14, 2023
Com fim da CTPS em papel, população vulnerável enfrenta dificuldades para acessar informações trabalhistas
Desde a implantação do formato digital do documento, brasileiros sem acesso à internet não conseguem obter carteira de trabalho física e desconhecem registros profissionais
À margem das facilidades advindas das inovações tecnológicas, como obter documentos “com um clique”, cidadãos vulneráveis, que não possuem smartphones e computadores, ou sequer têm acesso à internet, estão impedidos de visualizar as informações que constam na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS). O documento oficial, em suma, registra a vida profissional do trabalhador e garante o acesso aos direitos trabalhistas previstos em lei, como seguro-desemprego, benefícios previdenciários e FGTS.
Atualmente, 28,2 milhões de brasileiros acima dos 10 anos de idade não tem acesso à internet, conforme levantamento mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) acerca do tema, divulgado no ano passado. O motivo mais mencionado para a exclusão digital foi não saber usar a internet (42,2%), enquanto 20% dos que foram consultados pelo IBGE apontaram motivos financeiros para a falta de acesso (14% disseram que o acesso à rede era caro e 6,2%, que o equipamento eletrônico necessário era caro).
Outra questão é que, para aqueles que já tinham a Carteira Digital emitida ao participarem de outras ações sociais, recuperar o acesso ao documento pela plataforma digital é dificultoso. É necessário fornecer informações detalhadas como, por exemplo, a data exata do desligamento de determinado emprego, valor específico de salários, entre outras perguntas criadas como forma de evitar o uso da conta digital por terceiros. Uma resposta errada e o sistema trava, e é liberado novamente somente após 24 horas.
Para não deixar que ninguém saísse desassistido, os servidores da Funsat e Funtrab chegaram a criar contas de e-mails para os cidadãos, até que as empresas que hospedam as contas eletrônicas passaram a bloquear novas tentativas, alegando que o procedimento poderia configurar fraude. Em uma grande teia de solidariedade, os computadores de estandes vizinhos passaram a ser utilizados, até serem esgotadas as possibilidades de atendimento.
Mais de mil pessoas em situação de rua passaram pelo mutirão ao longo dos três dias. Ao final, quem já tinha a CTPS emitida recebeu, em papel, um espelho do documento, que apesar de conter todo o histórico dos registros de trabalho, é mais suscetível a perdas, e não serve como documento oficial.
Pela natureza de sua condição, as pessoas em situação de rua buscavam, primordialmente, ter um emprego formal e, assim, voltarem a viver em condições dignas. “Ninguém fica na rua porque quer. Falta oportunidade e o primeiro passo é arrumar um emprego, ter um registro em carteira para se sustentar”, afirmou Joice Garcia Rodrigues, que saiu sem o documento físico.
“Ao trabalhador, basta informar o número do CPF no momento da contratação. Para o empregador, as informações prestadas no eSocial substituem as anotações antes realizadas no documento físico, conforme a recente Portaria do Governo Federal. Pode representar um avanço ao considerarmos a agilidade e praticidade do processo, mas é um avanço que é cruelmente excludente para as pessoas vulneráveis”, afirma.
Diante da situação, a procuradora do Trabalho entrou em contato com a coordenadora nacional do MPT de Promoção de Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho (Coordigualdade), Dra. Melícia Alves de Carvalho Mesel, colocando-a a par da experiência com o Pop Rua Jud e solicitando providências para reverter este tipo de exclusão das pessoas em situação de rua.
“Constatamos a exigência de um smartphone ou outro meio digital para obtenção do acesso à Carteira Digital. O problema é que a população em situação de rua e em extrema vulnerabilidade não tem acesso ou recursos financeiros para isso. São pessoas que ficam excluídas deste processo, o que configura o cerceamento de direitos básicos. Durante o Pop Rua Jud foram encontradas alternativas para solucionar o problema, mas recorremos ao MPT para que a questão seja ajustada no longo prazo”, pontua a magistrada, reforçando, ainda, que medidas administrativas de inclusão das pessoas em situação de rua estão previstas na Resolução nº 425/2021, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que instituiu a Política Nacional Judicial de Atenção a Pessoas em Situação de Rua e suas interseccionalidades.
Fotos: Divulgação/ MPT-MS
Rua Dr. Paulo Machado, 120, Bairro Royal Park | 79021-460 | Campo Grande-MS
(67) 3358-3035 | (67) 99275-8636 | (67) 99211-3420|
prt24.ascom@mpt.mp.br | www.prt24.mpt.mp.br